PAULO FREIRE por CEPF-UFU

/Camila Lima Coimbra – Coordenadora do CEPF-UFU

Nasceu em 1921, completaria 100 anos em 2021, quando o mundo comemorou seu Centenário. Paulo Freire é um clássico. Uso a definição de Calvino (1993): “um clássico é um livro que nunca terminou de dizer aquilo que tinha para dizer”.  É assim que o Círculo de Estudos e Pesquisas Freireanos (CEPF) da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) sente quando lê ou relê uma obra de Paulo Freire.

Logo do Círculo de Estudos e Pesquisas Freireanos (CEPF-UFU). Arte de Felipe Menegheti. Fonte: Site do CEPF-UFU.

#PraCegoVer: A logomarca do Círculo de Estudos e Pesquisas Freireanos foi criada pelo Felipe Menegheti e apresenta um desenho do rosto de Paulo Freire com fundo branco e traços em preto. Paulo Freire está de barba, óculos e um olhar para o horizonte. Em torno do rosto do Paulo Freire há, de forma circular, a descrição Círculo de Estudos e Pesquisas Freireanos e na parte central, embaixo do rosto, a sigla CEPF, em verde.

 

A escolha do primeiro livro para leitura coletiva no CEPF-UFU foi “Educação como Prática da Liberdade” (1967), livro que apresenta uma categoria estruturante que consideramos fundamental para compreender a sua obra: o ser humano, o “ser mais” freireano:

Entendemos que, para o homem (e a mulher), o mundo é uma realidade objetiva, independente dele, possível de ser conhecida. É fundamental, contudo, partirmos de que o homem (e a mulher), ser de relações e não só de contatos, não apenas está no mundo, mas com o mundo. Estar com o mundo resulta de sua abertura à realidade, que o faz ser o ente de relações que é. (FREIRE, 1967, p. 39)

Como ente de relações, o ser humano desumaniza-se ao adaptar-se, acomodar-se, ajustar-se, massificar-se, desenraizar-se. O que liberta esse ser humano, o que o conscientiza, o que o transforma, o que a educação pode fazer é resistir aos poderes da massificação e do desenraizamento, por isso, talvez pudéssemos usar o plural na unidade: os seres humanos, da multiplicidade freireana. Somos seres múltiplos.

O pensamento freireano não isola e nem divide a compreensão de totalidade do ser humano, essa premissa é importante para o entendimento de sua complexidade. Um ser também da comunicação, por isso o diálogo existe como o meio desse processo educativo, nessa perspectiva.

O homem (a mulher) existe – existire – no tempo. Está dentro. Está fora. Herda. Incorpora. Modifica. Porque não está preso(a) a um tempo reduzido a um hoje permanente que o(a) esmaga, emerge dele. Banha-se nele. Temporaliza-se. (FREIRE, 1967, p. 41)

Esse ser temporal, portanto, histórico, cultural, social que age, também é um ser da práxis. Um ser que pensa e age a partir da realidade. Essa concepção de ser humano freireana considera um princípio de que somos seres inacabados e condicionados. A ideia do inacabamento é que provoca as possibilidades de mudança, especialmente pela educação. É nessa definição de ser humano que habita na história, que é gerado o conceito de práxis, pois, o ser humano enraizado é um ser da práxis.

Ao comemorar o Bicentenário do Brasil, aproximamos às comemorações do Centenário de Paulo Freire em 2021, patrono da educação brasileira, ao destacar a importância de Paulo Freire na constituição de uma sociedade em transição (de 1955 até 1964), de seu exílio durante a ditadura militar (de 1964 até 1980), sem esquecer de sua recificidade e, por fim, de seus 17 anos no retorno ao Brasil (de 1980 até 1997), em que chega, dizendo que precisaria “reaprender o Brasil”. Três momentos em que Paulo Freire não se eximiu de discutir a realidade e a identidade cultural brasileira, a nossa sociedade de classes e os efeitos da mesma na educação. Em toda a sua vasta bibliografia, porém destacamos as três pedagogias: Pedagogia do Oprimido, o reencontro em Pedagogia da Esperança até chegar no movimento de síntese realizado em Pedagogia da Autonomia.

Ainda no finalzinho de 2020, a Universidade Federal de Uberlândia e Universidade Estadual de Campinas criaram, por meio das Faculdades de Educação e da arte de Felipe Menegheti, um selo em comemoração aos 100 anos de Paulo Freire e 105 anos de Elza Freire.

Selo comemorativo ao Centenário de Paulo Freire (1921-1997) e aos 105 anos de Elza Freire (1916-1986), materializado na arte de Felipe Menegheti. Fonte: https://comunica.ufu.br/noticia/2021/01/ufu-e-unicamp-lancam-selo-comemorativo-pelo-centenario-de-paulo-freire

#PraCegoVer O Selo comemorativo ao Centenário de Paulo Freire (1921-1997) e aos 105 anos de Elza Freire (1916-1986) foi criado pelo Felipe Menegheti e apresenta os desenhos do rostos de Paulo Freire e Elza Freire com fundo branco e traços em preto, dos dois sorrindo. Em torno dos rostos há, de forma circular, uma linha vermelha escrito em branco, na parte de cima Centenário Paulo Freire (1921-2021) e embaixo, escrito em vermelho “E 105 anos Elza Freire” (1916-2021).

 

Esse selo carrega em nossa história, as possibilidades e os encontros que temos em nossas vidas profissionais e afetivas. O selo marca a agenda das comemorações institucionais e em redes profissionais, acadêmicas, relacionais e freireanas no Brasil e pelo mundo. Como dissemos, no texto de lançamento:

Dois em um. Um em muitos. Muitos em dois. Trocadilho para iniciar uma categoria fundamental para a compreensão do pensamento freireano: a ideia de um sujeito histórico, que se faz a partir e com suas experiências, formação, trajetória vivenciadas nas relações sociais, constituindo-se, assim, em cada identidade cultural presente na diversidade da realidade brasileira. Se assim somos, identificamos no pensamento de Paulo a presença, a convivência, a permanência, a influência da educadora Elza. (COIMBRA e SPIGOLON, 2020)

Se assim somos, também identificamos em nós, “a convicção de que a mudança é possível” e de que “ensinar exige a corporeificação das palavras pelo exemplo”. Dois saberes importantes para nossa práxis, para nossa reflexão, para a ampliação de nossa leitura de mundo.

Além da leitura de mundo que precede a leitura da palavra, Paulo Freire também anuncia categorias importantes para a realidade política, social, histórica e econômica que vivemos. O conceito de justa ira: “A minha raiva, minha justa ira, se funda na minha revolta em face da negação do direito de ‘ser mais’ inscrito na natureza dos seres humanos”. (FREIRE, 1996, p. 30) A raiva, a rebeldia, a desacomodação contribuem para a ampliação da leitura de mundo e nos mobilizam, como sujeitos, para a transformação. “É a ‘leitura do mundo’ exatamente a que vai possibilitando a decifração cada vez mais crítica da ou das ‘situações-limites’, mais além das quais se acha o ‘inédito viável’”.  (FREIRE, 1992, p. 51) Os inéditos viáveis são a materialização da práxis humana.

E para encerrar com uma outra categoria que consideramos fundamental para compreensão do pensamento freireano, trazemos a utopia: “Denúncia de uma realidade desumanizante e anúncio de uma realidade em que os homens possam ser mais. Anúncio e denúncia não são, porém, palavras vazias, mas compromisso histórico.” (FREIRE, 1979, p. 42)

A utopia verdadeira de Freire anuncia uma crença incondicional no “ser mais”, na possibilidade de mudança na educação porque feita de sujeitos históricos, sujeitos da práxis. Sujeitos que se libertam em busca do “ser mais”, mobilizados/as pela utopia que esperança a transformação social necessária. (A esperança aqui usada como verbo, como ação concreta.)

Dessa forma, consideramos que o legado de Paulo Freire contribui para os 200 anos de Brasil, nessa luta histórica pela educação, pois defende, desde a “Educação como prática da liberdade” uma educação que resista aos poderes do “desenraizamento”, pois o ponto de partida é a identidade cultural dos/as educandos/as e para além disso, a pergunta que se faz desde lá e se faz atual: como conseguir o desenvolvimento de uma sociedade, como suporte da democracia, de que resulte a supressão do poder desumano de opressão das classes muito ricas sobre as muito pobres? Essa pergunta talvez seja uma contribuição importante ao bicentenário brasileiro, quando complementa: “na verdade, se há saber que só se incorpora ao homem (e a mulher) experimentalmente, existencialmente, este é o saber democrático.” (FREIRE, 1967, p. 92)

Os processos de transformação, conscientização e libertação freireanos residem no campo da democracia, na “utopia verdadeira” da luta e da resistência na injusta e desigual sociedade brasileira. Esse talvez seja o desafio dos próximos cem anos brasileiros, pois ainda temos muitos inéditos viáveis a serem construídos na Educação Básica e na Educação Superior. Por isso, Paulo Freire vive!

Referências

CALVINO, I. Por que ler os clássicos? São Paulo: Companhia das Letras, 1993.

COIMBRA, Camila Lima Coimbra e SPIGOLON, Nima. Centenário de Paulo Freire e 105 anos de Elza Freire. Disponível em https://www.fe.unicamp.br/noticias/congregacao-da-fe-aprova-criacao-do-selo-comemorativo-do-centenario-de-paulo-freire-e-105. Acesso em 29 de setembro de 2021.

FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1967.

FREIRE, Paulo. Educação e mudança. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. 29. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Esperança: um reencontro com a Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Publicado com prefácio de Ernani Maria Flori. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1970, 218p.

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